sábado, 31 de março de 2012

O Facebook é uma empresa privada e nós os trabalhadores não remunerados

Adoro a controvérsia instaurada com a questão do timeline. O povo, pelo menos uma vez na vida, está genuinamente revoltado. Como é que o Facebook se atreve a impor assim uma alteração profunda ao nosso modus vivendi? Como é que o Facebook tem a presunção e a arrogância de mudar a vida de milhões de pessoas no mundo todo? Gosto de ver a paixão com que se arremessam essas questões, dado que outros temas meramente secundários, como a política desta governo e a falta de democracia que impera por aí, são alvo de uma saudável apatia de quem quer mas é ir fazer mais uns likes no Facebook. Mas permitam-me apenas dizer duas coisitas de nada. A questão do timeline resume-se a uma questão de alteração do design de um site. Há milhões de sites em todo o mundo e nunca vi tamanha preocupação porque agora vamos começar a ver a informação em duas colunas e coiso e tal. Em segundo lugar, e lamento ter más notícias, é que o Facebook é uma empresa privada. Tem donos. Conselho de administração. É cotada em bolsa. Não é o Estado Social, para o qual supostamente todos contribuímos com os nossos impostos e nos parecemos estar a cagar. E é ainda menos uma comunidade aquariana de irmãos fraternos que fazem meditação transcendental de manhã e cantam mantras à noite, em nome de um mundo sem guerras e do fim da fome no mundo. O Facebook é uma empresa que faz dinheiro. Cada post ,comentário, like, mensagem, share, cada foto, vídeo ou pergunta que nós colocamos lá está a dar dinheiro a ganhar a alguém que não nós. Daí que me parece um pouco excessivo – mas só um pouco - comportarmos-nos como se o timeline e outras mudanças que tal nas funcionalidades do carinhosamente chamado Face fossem, o equivalente a entrar na nossa casa a equipa do Querido Mudei a Casa sem a nossa permissão. A nossa permissão não é tida nem achada. Basicamente, nós somos o parente pobre que vive no quarto dos fundos sem janelas e come os restos enquanto outros se enchem de dinheiro. E depois o parente pobre ainda se vinha queixar a quem lhe dava um tecto e lhe forrava o estômago? E queixar-se a torto e a direito, ai a minha privacidade, ai que o Facebook tem mais informação do que a CIA, ai que isto é um perigo. Não é nada um perigo, é mais uma falsa questão. Porque fomos nós que chegámos lá e metemos a fotografia em biquíni agarrada ao matulão de dois metros, que achamos graça a pespegar as imagens dos nossos putos, quando essas fotos, publicas, podem andar a alimentar sites de pedofilia e sim, pode haver um desdentado qualquer no planeta a masturbar-se com a foto do biquini fio dental tirada nas férias na República Dominicana. Nós é que achamos graça quando apareceu a aplicação que permite partilhar com o mundo que estamos em Sesimbra a comer jaquinzinhos com o Tó Manel. Nós e que metemos o está numa relação e está solteiro e está casado e mora em Freixo de Espada a Cima e comentamos o post do nosso colega de trabalho com o BM com laivos libidinosos e depois nos queixamos que o namorado nos anda a controlar o mural. Acordem para a vida. O Facebook não é, nem tem de ser, a Santa Casa da Misericórdia. Nós é que o fizemos, mas nós também fizemos a sociedade capitalista e ninguém vai bater à porta da EDP a pedir uma fatia dos lucros ou à Lusoponto a pedir dividendos. O Facebook não é a nossa casa, nem a nossa consciência, nem a nossa vida. O Facebook é uma ideia brilhante, porque é a única empresa no mundo que vive à nossa custa, os únicos trabalhadores não remunerados que até adoram o que fazem. Se isso não é genialidade, vou ali e já venho.

Sem comentários:

Enviar um comentário