terça-feira, 8 de novembro de 2011

Sapatos e a auto-estima de uma mulher


Está chuva, está frio e estou rezingona. Aquela resmunguice sem motivo e com todos os motivos. Sinto-me paradoxal (não sei se a palavra existe, mas se não existe devia existir para aquele estado de espírito entre o estou fodida com o mundo e isso é um perfeitamente disparate, não há motivos objectivos para isso, a não ser ainda não ter ganho o euromilhões). Apetece-me ir para casa, enrolar-me numa manta e ver episódios atrás de episódios do Mentes Criminosas. Em vez disso, exponho-me às intempéries do estado meteorológico de cada vez que quero ir fumar um cigarro, tenho de enfrentar o trânsito de Lisboa em dia de greve e acho que trouxe uns sapatos estilo boy que não combinam com o resto. No fundo, acho que são esses os únicos culpados do meu desassossego. Sim, a futilidade inerente a uns sapatos. Sim, a profundidade de um estado de espírito que depende de um objecto trivial.  Não é uma questão fútil. É uma questão de estética. Da minha estética pessoal. Já se sabe que basta uma escolha destas mal feitas para que o desconforto de instale. Como sair de casa com um lenço que não joga com nada, com um casaco de malha que fica mal naquelas calças, com o casaco completamente fora de tom. Lembro-me sempre de quando se dizia que lavar o cabelo todos os dias fazia mal e lá me obrigava a lavá-lo dia sim, dia não. O dia não era sempre catastrófico. Em seis dias, tinha três bons, porque o facto de sentir o cabelo menos limpo me lançava num desconforto oleoso. Não que acho que alguém notasse no facto. Mas eu sabia e essa consciência bastava. Mas ainda bem que o mito do faz mal ao cabelo caiu por terra e hoje lavo, sem remorsos, o cabelo todos os dias. Não posso é andar para aí nua e lá vai que tenho de fazer escolhas e combinações todos os dias! Por vezes, erro, mas, a não ser se for uma fashion addict, que vai dizer “hummm, uma meias de lã ali faziam toda a diferença”, só eu é que realmente sei do facto. A auto consciência é bem pior do que a consciência exterior. Se não a tivermos, a outra não nos agride. O que não se sente, não pode fazer mal. 
Mas continuo a pensar: a nossa auto consciência é dependente dos pormenores ou são os pormenores determinados pelo nosso estado de espírito? Escolhi estes sapatos e fique assim, ou escolhi os sapatos porque estava assim? Somos nós que fazemos o nosso dia ou o nosso dia que nos faz a nós? Hem? Essa é a verdadeira questão! Essa e: se ao menos hoje eu tivesse vindo de botas, nada disto teria acontecido.

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