sexta-feira, 13 de julho de 2012

As grávidas e a síndroma da virgem Maria


Durante muito tempo pensei que a gravidez e a insuportabilidade andavam indissociavelmente de mãos dadas: uma mulher engravidava, o cérebro descia para o útero e tornava-se o ser mais chato e desinteressante à face da terra (note-se: há exceções, mas poucas). De repente, compreendi que não é nada disso: as pessoas é que já são inerentemente achatadas de cérebro e de interesses e nesse caso a gravidez é a época mais significante que alguma vez terão na vida para dar largas a toda a necessidade ontológica de serem o centro das atenções. A gravidez não provoca nada que não está lá desde o início, dá é campo aberto à expressão desse lado da personalidade, fútil, obsessiva, autocentrada, ansiosa da atenção do mundo, mesmo àquelas mais tímidas em situações normais. Estou enjoada, estou com azia, dormi tão mal esta noite, não tenho posição na cama, ai os meus pés estão inchados, aí que sinto tanto desejo de comer bife cru, aí que me cansa tanto por estar sentada, ai que não consigo estar de pé, ai que não consigo cagar, ai que não consigo foder, ai ai ai, (isto logo a partir das dez semanas), em discurso direto, ininterrupto, indiferente ao contexto e ao facto de por vezes as pessoas quererem falar de outros temas e com garantia do feedback de todas as ex-grávidas que vêem logo ali oportunidade, ao partilhar destas preocupações - obsessões - retrocederam à sua fase virgem Maria. É que a gravidez se assemelha ao síndroma Virgem Maria. As mulheres podem ser burras, limitadas, desinteressantes, castradoras, impossíveis de aturar, mas nesta fase tornaram-se inatacáveis. Alguém lhes diz por acaso está lá caladinha um bocadinho com os teus problemas e prisão de ventre qu  já não te posso ouvir? Não, há uma aura de pecado, um peso intangível que nos faz morder a língua e aguentar a lenga-lenga. Porque, afinal, ela está grávida Mesmo que gravidez não seja doença. Porém, a proliferação do síndrome Virgem Maria faz-me pensar que talvez psicologicamente não batam mesmo com os pirolitos todos. O que me leva ao passo seguinte: o que é que vai ser daquelas crianças?

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