quarta-feira, 11 de julho de 2012

Ai a greve que dá cabo da minha vidinha de merda!


Adoro as reportagens que rádios e televisões fazem em dias de greve. Enviam os jornalistas às cinco da manhã para hospitais, centro de saúde perdidos no meio da serra, estações de metro e de comboio e de barcos, para ‘sentir o pulso’ ao sentimento geral da nação. O pulso está em taquicardia, claro, à beira de um ataque de nervos porque as pessoas estão incomodadas nas suas vidinhas, imagine-se só! E as pessoas queixam-se e queixam-se e gritam aos ouvidos dos jornalistas. Acham ‘ aquilo’ uma pouca vergonha. Uma chatice. Um aborrecimento. Imoral. Devia ser proibido, como dizia uma senhora. Da minha parte, só gostava de compreender uma coisa: a greve como protesto legítimo do Estado democrático é suposto chatear, não é? Se não, qual era a apoquentação? O peso negocial? No caso dos médicos, até era fixe para o Estado, que não tinha de lhes pagar salário nesse dia. Mas as pessoas andam tão gloriosamente centradas nos seus próprios umbigos que só se podem tornar imbecis em momentos assim, em que as aborrecem. Claro que a greve causa atritos na ordem das coisas: não há consultas, não há transportes. Mas aquelas pessoas estão a exercer um direito de protesto que lhes assiste numa democracia. Pelo menos, não estão de braços cruzados como 99% da população, que perde o seu tempo a pensar ‘no que eu tive de andar para chegar aqui, no tempo que eu perdi, no incómodo que me deu’. Da minha parte sinto-me com vontade de dizer depois não se queixem das vossas vidas de merda. Se estão presos no imobilismo do ‘mim’, das vossas exclusivas preocupações, e do medo, agora aguentem lá com as greves dos outros que é bem feito.

1 comentário:

  1. E se as pessoas não se queixam espontâneamente, o jornalista, com o micro como saca-rolhas, extrai cuidadosamente todo o relato do incómodo que pode...

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